quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Cyberpunk

Bom, cyberpunk é um genero literario muito interessante que tem como caracteristicas principais
o futurismo. Filmes como Matrix e Laranja Mecanica tem inspiracoes deste tipo, creio entao que já da para visualizar... ultimamente venho lendo algo a respeito e me deu a ideia de escrever algo parecido (isto n significa que Sujo, Podre e Imbecil irá parar).


Zero - A primeira noite. PT1


Talvez seja bizarro isto em seu tempo, mas no meu a narrativa que se segue é a realidade, não importa como isto chegou às suas mãos, o que você está lendo não é efeito de alucinógeno, mas talvez qualquer tipo de droga disponível possa lhe trazer mais conforto sobre o que tenho a contar e sobre o que seus genes futuros materializados em outros corpos e mentes estarão a encarar.

Cento anos após o lançamento das primeiras nanam tecnologias neuronais, eu nasci – ano de dois mil e setenta e dois. O que pra voce pode ainda nem ter chegado, para mim é algo comum, às vezes ignorado, às vezes na moda ou ainda outras tantas vezes... Mortal. Em um mundo capitalista espacializado, onde o homem é passível de programação cibernética, identificação via microondas lançadas por satélite monitores espaciais esteja na China ou na Escandinávia, estar biologicamente puro pode ser estranho, ou até mesmo vitima de preconceitos de diversos tipos.

A era em que os vícios mais psicodélicos e doentios são tão sociais quando pão, o mundo lá fora se torna tão frio quanto o concreto e volúvel como um esquizofrênico. O bizarro deixa de ser bizarro, a palavra perde o valor diante da realidade ou se torna sinônimo da própria e diante do terror, e da morte cada um de nós mata para alcançar mais longe e disso eu tenho experiência, com cento e vinte e três anos que completei no dia de ontem. Como consegui isso? Sinceramente, não me invejem... Eu não teria inveja, nem arrependimento – mas tudo tem o seu preço e o momento do pagamento nunca é bom e por outro lado, existem outros matusaléns por ai à solta.

Bom, vamos ao que interessa. Sou um elemento raro diante da sociedade pós-moderna, ou ultra-moderna se preferir. Nasci em um leito de hospital fruto da relação sexual de meus pais, lhe parece comum? Durante toda a minha vida me foi estranho, eu sempre tive alguns dos defeitos genéticos de meus pais misturados às qualidades, sendo que poderia muito bem ter sido fruto de uma inseminação artificial e ter tido meus dados cuidadosamente selecionados. Um eterno ressentimento, não ter tido esse privilegio tão comum apenas por conta de um capricho purista da parte deles.

No entanto, dentro do possível eu me tornei um moleque resignado e pronto para desafios, mesmo quando eu sabia que tinha limites físicos mais evidentes que os demais, pude me destacar em produção de conhecimento durante toda minha vida escolar. Mas meus pais, principalmente minha mãe, psicóloga e profunda conhecedora das emoções e da existência contemporânea, sabiam de minhas angustias. Como tentativa de reparar o estrago feito, aos doze anos, recebi meu primeiro implante, uma Carta-Célula, não é uma das mais caras, e não é uma das mais comuns, servia para aumentar as possibilidades corporais e ao mesmo estimulando inibidores de fadiga em sua programação adaptada ao usuário.

Ainda existia um ressentimento em mim, porém abrandou-se a ponto de sentir identificação com meus pais e passar a ler um pouco dos livros de ambos. Meu pai que era um catedrático da Universidade Federal passou a me incentivar e durante minha adolescência adquiri um conhecimento acima da média. E então, eu tive algo que era diferente da maioria das pessoas que me dava certo orgulho, pois em um tempo em que as massas não sabem ler ou escrever, ou sabem isso de forma falha, eu estava me encaminhando para uma universidade, onde apenas um punhado de pessoas estavam.

Mas o sonho não durou muito tempo, a identificação genética era praxe, e devido à raridade de um caso como o meu, virei alvo de fuxico graça e escárnio. Bulling em outras palavras. Resisti dois semestres de humilhações até mesmo por parte dos funcionários de baixo escalão. Uma ferida se abriu em mim, o ressentimento quase esquecido voltara e uma profunda crise depressiva se apoderou de mim. Passei semanas sem me alimentar, sustentado a base de drogas injetáveis e escondido no mundo paralelo do meu quarto até o dia em que o fundo do poço chegou.

Como se estivesse me afogando, eu corri como se estivesse nadando para fora de casa no meio da madrugada, alcancei a rua e quase fui atropelado por um carro flutuante que graças ao sensor de impacto pode se desviar de mim. Mas em mim não havia alivio, apenas o sofrimento que havia se apoderado, suando e bufando, em meio a pessoas que voltavam para casa sem me enxergar, eu corria, me esbarrava e a pedra em meu peito pesava cada vez mais, e quando cheguei ao alto de um viaduto, senti a bomba que eu era, programado para explodir. Porém, diferente do que o sistema achava. A bomba falhou.

Do alto do viaduto pude ver pequenos carros passando na rua lá embaixo, o medo de morrer havia arrancado de mim momentaneamente a pedra em meu peito. Minha respiração pesava e meu corpo pulsava turbilhões de adrenalina que mantinha meu sangue circulando como pessoas em horário de pico nas ruas movimentadas da cidade.

- Hei moleque! – ouvi uma voz dizer atrás de minha nuca, meu coração gelou quando senti algo frio encostar em minha blusa de náilon – cê ta ferrado! Passa tudo pra cá!

- Não tenho nada!

- Então vou te espetar!

Fechei meus olhos, estava tudo acabado, pensei o sistema realmente queria acabar comigo naquela noite, o antivírus tinha de fazer efeito e expulsar um dos defeituosos dele. Esperei a estocada em minhas costas com as mãos sobre a cabeça e o corpo retorcido, tremulo. A estocada nunca veio. Um som de feixe atravessou o barulho dos carros da madrugada e um cheiro asqueroso de queimado subiu ao ar.

Assustado, me virei para saber o que havia acontecido e vi o cara morto no chão com um grande furo queimado em suas costas expondo parte de seus órgãos internos fumegantes. Vomitei sobre o corpo e completei a obra de arte pitoresca.

Limpei minha boca com a manga da blusa, e vendo novamente aquele corpo trespassado, queimado e vomitado, quase me fez desmaiar. Apesar de ver desgraças como estas na televisão diariamente, a coisa se torna bem pior quando se está vivenciando. Segurei a vontade de vomitar novamente com muito esforço.

Procurei saber de onde havia vindo o tiro, mas não encontrei ninguém e tudo parecia ignorar aquela cena, um homem morto e um garoto desesperado. Tive vontade de gritar, saber o que estava havendo, mas as respostas às minhas indagações internas era apenas o sopro do vento frio que trazia o cheiro acre e úmido das ruas.

Até que então, vindo na contramão da rua, uma moto do estilo modelo ultrapassado com rodas e sem GPS que fora proibido há trinta anos vinha rasgando a estrada fazendo barulho, quando alcançou a minha proximidade o motociclista iniciou uma manobra de freio em meia lua que acabou quase me atropelando e estacionando sobre o corpo estendido. Uma injeção de adrenalina me tomou e eu me joguei ao chão.

O cara que desceu da moto usava uma jaqueta de couro sintético, calça jeans corporal adaptável e um tênis branco surrado, o seu rosto era curtido e de aspecto mal humorado, mas não era velho, em seu cinto havia um coldre e uma pistola laser modelo 212 – permitido apenas para a polícia.

- Matei esse desgraçado! – ele tirou um tablete de alguma coisa do bolso e tomou e em seguida ascendeu um cigarro – Punk idiota.

Sem ao menos parecer se dar conta de minha presença, ou aqueles que passavam se dar conta de nós, ele puxou uma lamina cirúrgica e começou a abrir o crânio do morto de forma grotesca ali em pleno viaduto, no meio da cidade em uma noite qualquer e ninguém, ninguém nem se quer um dia soube disso, a não ser eu e o motoqueiro. Vomitei novamente, mas agora em minha mão e abafando o quanto foi possível os meus gemidos.

Praticamente de costas para mim o cara continuava lá, a fazer a sua cirurgia bizarra e então o vi sentir-se satisfeito por finalmente perfurar o crânio e encontrar na massa cerebral um pequeno chip que seria imperceptível se não piscasse uma pequena luz vermelha.

- Garoto – o disse sem virar para mim e em tom de sutil ameaça - você não viu nada está noite, se tiver visto, será tostado que nem esse filho de uma puta entendeu?

- En... – eu tentava pronunciar algo, mas o medo me sufocava.

- Acho que você entendeu.

Ele montou em sua moto, ligou o motor e em alta velocidade ele sumiu de lá, deixando-me vivo e junto ao corpo bizarramente assassinado e operado. Mas antes que me desce conta, como se fosse um zumbi, me afastava daquela cena num andar doentio e cambaleante, impressionado com o acontecido e feliz por estar vivo o suficiente sentir náusea e repulsa.